Páginas

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Vírus Flame: a primeira bomba atômica da ciberguerra

Em 2010, Richard. A. Clarke, que foi chefe dos serviços antiterroristas dos Estados Unidos com Bill Clinton e George W. Bush, publicou um ensaio entitulado Cyber War (Ciberguerra). Assim resenhou, muito criticamente, a revista Wired: "Encontrarão aqui o Livro do Apocalipse reescrito para a era da Internet, com o fim dos tempos anunciado pelos Quatro Cavalos Trojanos do Apocalipse". 

Pois bem, essa III Guerra Mundial que gurus como Clarke levaram anos profetizando e para a qual potências como Estados Unidos, Israel, Rússia e China têm se preparado, começou? Mesmo sem querer ser apocalíptico, o recente descobrimento do maligno informático Flame (Worm.Win32.Flame) parece indicar que estamos nos primeiros embates de tal conflito.

O Flame, segundo informa Douglas Rushkoff em seu artigo "The cyberwar may be headed to your computer" (A ciberguerra pode estar chegando ao seu computador - tradução livre), na CNN, "tem todos os indícios de constituir um ciberataque projetado por um Estado-nação: é poderoso e complexo, e aponta diretamente para uma zona muito quente, o Irã". Seu objetivo parece ser sabotar o programa nuclear iraniano, mas em poucos dias provocou um intenso debate entre os especialistas sobre a possibilidade de que se transforme numa peste incontrolável que termine afetando serviços civis nacionais inteiros como redes elétricas, indústrias energéticas, redes bancárias ou sistemas de tráfego aéreo.

"Estamos diante de uma perigosíssima caixa de Pandora"
Na quarta-feira, dia 6 de maio, o descobridor do Flame, o caça-vírus russo Eugene Kaspersky declarou durante uma conferência em Tel-Aviv, também assistida pelo ministro da Defesa israelense Ehud Barak, que a comunidade internacional deveria começar a pensar em como proibir o uso da ciberguerra, do mesmo modo que em algum dia foram proibidas as armas químicas e biológicas. "Estamos", anunciou Kaspersky, "diante de uma perigosíssima caixa de Pandora". "Isso", disse literalmente, "não é ciberguerra, isso é ciberterrorismo, e temo que seja só o início do jogo, temo que isso poderia ser o fim do mundo como o conhecemos. Estou assustado, acreditem em mim".

Grava conversas, permite o controle remoto do PC,
tem Bluetooth, é indetectável pelos antivírus.
O Flame é muito sofisticado, faz parte de um pacote de programas - "o Microsoft Office do malware", como chama Rushkoff - que realiza tarefas múltiplas de espionagem e sabotagem: grava conversas, permite o controle remoto do computador, tem Bluetooth, vai se atualizando, é indetectável pelos antivírus existentes atualmente... Supõe, segundo especialistas, ser a arma mais maligna já inventada até os dias de hoje na ciberguerra.

Da mesma forma que apoia a guerra dos drones contra os jihadistas, Obama tem se tornado um entusiasta da ciberguerra secreta quando se trata de lidar com o programa nuclear iraniano, segundo informa The New York Times ("Obama Order Sped Up Wave of Cyberattacks Against Iran"; Obama ordena a intensificação de ciberataques contra o Irã - tradução livre).

Obama demonstrou preocupação, mas
logo mudou de ideia.
A guerrilha cibernética contra o Irã começou durante a presidência do segundo Bush e nela colaboraram Estados Unidos e Israel. Seu primeiro produto, o vírus Stuxnet, perturbou seriamente as instalações nucleares iranianas no final da década passada. Ao ser descoberto no verão de 2010 - a planta iraniana de Natanz escapou da infecção -, Obama expressou sua preocupação. Disse temer que a conversão dos Estados Unidos num musculoso hacker com bandeira nacional terminasse justificando política e moralmente os ciberataques contra esse mesmo país. No entanto, suas dúvidas acabaram rapidamente e chegou a aprovar a continuidade dessa forma de batalha, que, segundo The New York Times, é conhecida pela Casa Branca, pelo Pentágono e pela CIA como Olimpic Games (Jogos Olímpicos).

O Stuxnet parece ter sido acompanhado pelo recém-descoberto Flame. É claro, os Estados Unidos não reconhecem oficialmente nenhuma relação com esses vírus informáticos - 50 vezes mais complexos e pesados que os habituais - que minam o programa nuclear iraniano. Tampouco Israel. Embora, questionado sobre a possível relação de seu país com este malware, o vice-primeiro-ministro Moshe Ya'alon declarou recentemente: "Israel é abençoado pela alta tecnologia".

A ciberguerra já começou...
O órgão iraniano dedicado à luta contra a ciberespionagem e a ciberguerra (CERT, sigla em inglês) anunciou na semana passada que havia localizado o Flame. Havia infectado os computadores por dois anos sem ser detectado por nenhum antivírus. O descobrimento foi obra do laboratório especializado dirigido em Moscou pelo russo Eugene Kaspersky.

A polêmica instaurada pelo descobrimento do Flame tem dimensão mundial. Douglas Rushkof formulou a pergunta-chave: "Como podemos impedir que programas malignos como o Flame possa ser usados contra populações civis ou inclusive por populações civis? (...) As mesmas tecnologias que permitem aos Estados Unido e a Israel sabotarem o programa nuclear iraniano podem permitir, por exemplo, que os sindicatos do crime do Leste Europeu interfiram na atividade bancária de qualquer um de nós".

O Flame, segundo Kaspersky, é um "bumerangue cibernético que pode se voltar contra seus criadores". Na quarta-feira, em Tel-Aviv, o descobridor do vírus nomeou Estados Unidos, Grã-Bretanha, Israel, China, Rússia, Índia, Japão e Romênia como os países de onde poderia proceder essa ação pirata, mas se negou a ser mais concreto. Foi, no entanto, enfático ao afirmar que os governos sensatos deveriam começar a cooperar para deter esse tipo de ataques, da mesma forma que o fizeram - ou ao menos tentaram - com as armas nucleares, biológicas e químicas.

Após o descobrimento do Flame, a Microsoft, por meio do seu diretor de segurança Mike Reavey informou que se vê obrigada a reforçar a segurança de todos os sistemas operacionais e programas do Windows.

Nota de 8 de junho de 2012: a Força Aérea dos Estados Unidos já conta com 7.000 ciberguerreiros em bases no Texas e na Geórgia, segundo The New Yorker. Quantos mais em outros departamentos do Pentágono, da CIA e de outros órgãos do Governo federal estado-unidense?

Fonte: El País
Tradução livre: Jônatha Bittencourt

0 comentário(s):

Postar um comentário

Deixe aqui o seu comentário.